Entrevista Wilson de Santos

Entrevista Wilson de Santos

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Dona Margarida está fazendo 50 anos. E na trilha dos festejos da obra de Roberto Athayde, um dos textos brasileiros mais encenados no mundo, o ator Wilson de Santos dá vida à personagem cinquentenária com uma nova montagem de Apareceu a Margarida, onde oferece sua visão irônica e bem humorada ao icônico “monólogo tragicômico para uma mulher impetuosa”. Com direção de Elias Andreato, a peça está em cartaz no Teatro Renaissance, em São Paulo, numa temporada que se estende até 18 de dezembro, sempre aos sábados, às 19 h.

Feito a partir do filtro do humor, um dos traços em comum nos trabalhos do ator Wilson de Santos e do diretor Elias Andreato. Assim, o autoritarismo desproporcional da professora, suas memórias pessoais e a abordagem incomum dos assuntos que ela traz à tona são usados para levar o ator a fazer aquilo que ele sabe criar como poucos: uma cumplicidade direta – e sempre hilária – com o público. Foi assim com a Irmã Maria José em “A Noviça Mais Rebelde” e com as mulheres de “Brincando em cima daquilo”, só para citar montagens recentes onde a quarta parede veio abaixo com a presença do ator em cena.

Essa é a primeira vez que Wilson e Elias trabalham juntos, e a dupla resolveu começar a parceria exatamente com Apareceu a Margarida, levando ao palco o desafio de criar uma nova versão dessa professora de personalidade tão autoritária quanto surpreendente. Em uma viagem vertiginosa de raciocínio, Dona Margarida expõe sua visão do mundo em um diálogo direto e desbocado com a plateia, que se transforma em sua classe de alunos insubordinados. Nessa “aula” incomum, temas como autoritarismo, sexo e educação são misturados e transformados num fluxo de ideias inusitado, criando uma metáfora sobre as consequências dos abusos de poder em uma sociedade inculta e passiva.

☝Vamos a entrevista?

😉 Aprecie sem moderação!

Wilson de Santos/Arquivo Pessoal

Eunoteatro- O método tradicional de ensino – aprendizagem proposto pela professora Margarida na peça “Apareceu a Margarida”, de Roberto Athayde, é baseado no autoritarismo, no tratamento vertical, na obediência sem questionar e na meritocracia. Ela acredita ser detentora do conhecimento e que a sua função é transmiti-lo, sem levar em conta os saberes prévios dos alunos. Ainda hoje essa metodologia que está mais próxima da opressão do que da construção do pensamento livre é muito difundida na educação brasileira. Você acha que o modelo de educação bancária funciona como um mecanismo de silenciamento?
 
Wilson de Santos- Sim, acho que o “método Margaridiano” é usado na intenção de depositar uma regra, uma espécie de doutrina feita para manipular seus alunos. Infelizmente sabemos que esse tipo de “aula crime” ainda é muito difundido em nosso país. Para Dona Margarida os que merecem são aqueles que obedecem, ela diz: “a obediência é a rainha de todas as virtudes.”  A ideia de pensamento livre passa longe, ou melhor, para ela não existe essa opção.

Eunoteatro- Ao colocar no palco uma professora que opta pelo terror para manter a ordem e moldar a mente dos estudantes, o texto conversa com formas autoritárias de poder. Assim como na época em que foi escrita a peça (em meio a ditadura militar) quanto nesta é importante pontuar a forma autoritária dos governos. Como você acha que a nova montagem dialoga com o cenário político atual do Brasil?

Wilson de Santos- É assustador como esse texto escrito há cinquenta anos atrás, chega em pleno século 21 com ares de atualidade. Apareceu a Margarida não é um retrato do passado, é o reflexo de uma triste realidade atual. Dona Margarida tenta moldar seus alunos sem dar opção de escolhas, a regra é clara, ela diz e eles acreditam, ela manda e eles obedecem. Essas mentalidades arcaicas continuam presentes nas cabeças de muitos e no assombroso cenário político atual que vivemos no Brasil e no mundo, “tá aí, tá na cara, pra todo mundo ver.”

Wilson de Santos – Apareceu a Margarida

Eunoteatro- Apesar do texto completar cinquenta anos em 2021 podemos considerá-lo muito atual. Ele passa por assuntos importantes como o abuso de poder, questões lgbtqia+, diversas formas de violência, sexo, nudez, entre outros. Você considera que os temas abordados em 1971 (quando foi escrita) ainda encontra espaço para ser debatido na sociedade contemporânea?

Wilson de Santos- Isso é uma realidade. É claro que de 1971 para cá tivemos avanços, tivemos muitos avanços e conquistas, mas a violência sofrida pelos menos favorecidos, a ganância do poder, a discriminação, a intolerância, a homofobia, as injustiças e o retrocesso, caminham lado a lado com nossas conquistas. Levar esse debate adiante é preciso e necessário.

Eunoteatro- A peça “Apareceu a Margarida” é um dos textos brasileiros mais encenados até hoje, inclusive no exterior. Conta para nós as referências que buscou para construir a personagem. Buscou inspiração em outros atores que já fizeram a professora? Teve aulas com alguma Dona Margarida?

Wilson de Santos- Apareceu a Margarida é um texto muito rico para o estudo de qualquer ator/atriz. Dona Margarida é um amontoado de emoções, um vulcão que as vez parece estar adormecido mas na verdade está em constante erupção. Durante nosso período de estudos e ensaios, tentamos refletir o quanto essa mulher é o reflexo da violência que ela própria foi submetida no decorrer da vida, uma mulher interrompida. Apareceu a Margarida é o texto brasileiro mais montado no mundo, no momento existem sete produções em andamento por países como: Inglaterra, França, Buenos Aires… Gostaria muito de ter assistido a primeira montagem com a grande Marília Pêra, perdi, mas, sem sobra de dúvidas é minha grande fonte de inspiração.
Tive uma Dona Margarida como professora no período escolar, mas conseguimos dar um cartão vermelho para a mesma, fora Donas Margaridas!

Wilson de Santos – Apareceu a Margarida

Eunoteatro- Gostaria que falasse um pouco sobre o humor que permeia a peça. Sobre se valer do cômico para falar de assuntos polêmicos, traço bastante arraigado na nossa cultura.

Wilson de Santos- Através do humor podemos fazer as maiores críticas, levantar discussões e bandeiras necessárias. Se isso pode ser um gatilho, que seja essa nossa melhor arma, essa sempre foi a grande função do humor, a crítica social. Na classe de Dona Margarida podemos ouvir muitas risadas incrédulas e nervosas, mas temos também momentos de vaias da plateia para a Professorinha… Quando isso acontece, eu em silêncio, festejo no palco.

Eunoteatro- Wilson, agradecemos por esta entrevista. É uma alegria para nós do @eunoteatro, tê-lo em nosso acervo. Seja muito bem vindo, muito obrigada e até a próxima!

Siga Wilson de Santos no Instagram: @wilsondesantos

Entrevista por: Thamíris Dias @thamiris.dias

Assessoria de Imprensa: Morente Forte @morenteforte

Serviço
Teatro Renaissance
Temporada: até 18/12/2021 
Al. Santos 2233
Sábados – 19h
Ingresso: R$ 40,00 (inteira) e R$ 20,00 (meia)
Duração: 75 minutos / Recomendação etária: 14 anos
Vendas on-line:
https://bileto.sympla.com.br

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