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Nosso entrevistado de hoje é Luiz Vieira. Ele é ator, jornalista e curador do perfil no Instagram @responderfazendo.
Luiz estreará amanhã, dia 11 de dezembro, no Teatro Commune, a peça “O Estranho Mundo de Grimm”.
Os contos de fadas tiveram sua ascensão no século XVII, na França. Autores como os irmãos Grimm foram precursores de histórias arrebatadoras disseminadas de geração em geração, contudo, com uma análise mais crítica da origem dessas narrativas, é possível perceber profundas alterações que o gênero sofreu ao longo do tempo, alterações feitas para diminuir o impacto negativo das histórias originais. A partir de uma leitura mais atenta de contos como A Gata Borralheira, João e Maria e A Bela Adormecida, o Centro de pesquisa Em Artes (CPA), faz apresentações nos dias 11 e 18 de dezembro no Teatro Commune da sua mais nova produção: O Estranho Mundo de Grimm.
Com músicas e trilhas sonoras originais, o espetáculo é livremente inspirado nas obras dos irmãos Grimm. Além dos célebres questionamentos da história, o espetáculo propõe um olhar mais atento sobre as outras relações entre os personagens enquanto família e indivíduos sociais.
😉Vamos a entrevista?
😍Aprecie sem moderação!
Eunoteatro- O fato de o espetáculo buscar as origens “obscuras” dos contos de fadas, que muita gente desconhece, faz com que aguce a curiosidade, pois trata-se de conhecida pelas crianças. Sabe-se pouco sobre as versões originais e, é nessa versão pouco conhecida, que você precisou se inspirar. Como foi o
processo da construção do seu personagem com as poucas referências encontradas?
Luiz Vieira- Na peça, eu faço o príncipe de Cinderela, ou A Gata Borralheira. Fugindo um pouco dos estereótipos que estamos acostumados a ver por aí, na nossa adaptação ele é gay e não está nem um pouco interessado em se casar – na verdade, ele quer mais é ficar com a “bufunfa” do pai e finalmente poder ser dono de tudo. Sobre as referências, você tem razão, o que logo vem à nossa mente são os filmes da Disney ou as histórias infantis, contudo, a verdade é que os contos de fadas sofreram muitas alterações ao longo do tempo para que o impacto das narrativas não pudesse assustar as pessoas e, de certa forma, se tornar mais comerciais, mas os vestígios de histórias perturbadoras e macabras estão todas ali, nas entrelinhas, nas frases curtas que são lidas rápidas demais. É necessária uma leitura mais atenta e contextualizada. E foi isso mesmo que fiz. Busquei o que estava dito, porém, ao mesmo tempo, velado. Nem sempre a maldade se apresenta de forma obscura, às vezes ela é tola e ingênua, como a Cinderela ou o João, do conto João e Maria. Eu busquei trabalhar muito com um olhar inquieto e ávido, com um tom de voz mais destoante e gestos retraídos. Meu príncipe é um personagem que bebe muito da fonte do teatro do absurdo também.
Eunoteatro- A maioria das crianças crescem envoltas aos contos de fadas, com o fascínio e magia que eles causam, os contos de fadas tiveram alguma importância em sua infância?
Luiz Vieira- Eu sou do interior de Minas Gerais, de uma pequena cidade ao nordeste do estado chamada Carbonita. Na minha infância, quando ainda morava na zona rural, eu ouvia muitas histórias sobre O Gritador ou bichos estranhos do mato. Este foi o meu primeiro contato com o mundo fantástico. Com os contos de fadas, só fui ter acesso mesmo na escola. Lembro-me que gostava muito de João e Maria. Mas pela ingenuidade – e pelas mudanças nas narrativas – nunca cheguei a pensar de fato nas obscuridades que a história carrega. Lançar um olhar para o passado e movimentar a minha consciência crítica para o presente ao me debruçar sobre estes textos me reconecta novamente com a grandiosidade destas narrativas. Elas são fascinantes e extremamente atuais, você não acha? Mark Twain já dizia que as histórias nunca se repetem, mas por vezes rimam. Acho que é por aí.
Eunoteatro- Você é ator e jornalista, como você faz para conciliar essas duas atividades para acompanhar os ritmos de ensaio, que normalmente perto de estreias, são sempre mais intensos?
Luiz Vieira- É difícil, para ser bem sincero. Normalmente, durante a semana busco ficar focado apenas no meu trabalho – não que ser ator não seja um trabalho, mas ainda não batemos ponto e, infelizmente, vivemos em um país que não sabe valorizar o que tem dentro e muito menos quem produz cultura por aqui. Sexta-feira a noite e aos finais de semana são os únicos dias que de fato consigo pegar o texto com mais calma e trabalhar de forma externa o que está sendo construído internamente em relação ao meu personagem. Ser
ator é um ato de resistência. Muito de nós temos dois, três ou quatro empregos que não tem nada a ver com a nossa profissão de artista, mas o mais importante está sempre presente: a vontade de estar no palco.
Eunoteatro- Sem dar “spoilers” para não estragar as surpresas (rs), poderia contar-nos um pouco sobre seu personagem?
Luiz Vieira- Bom, falei um pouco sobre ele na primeira pergunta, mas o meu príncipe é um príncipe além de seu tempo. Ele já sacou tudo, o que mais almeja mesmo é a fortuna do pai e ficar com o castelo só para si. Danado que ele! Além disso, não está muito preocupado em parecer ser filho do rei e nem agradar ninguém que o bajule. Ele é livre. Afeminado. E livre. Talvez a poc de escorpião mais perigosa da corte. Hahahahahahaha! Ele é tudo!! Uma delícia de papel para qualquer ator que também gosta de dar destaque aos coadjuvantes.
Eunoteatro- Como está sendo a experiência de trabalhar em uma produção com Ronaldo Saad, diretor do espetáculo e fundador do Centro de Pesquisa Em Artes (CPA)? É a primeira vez que trabalham juntos?
Luiz Vieira- Sim, é a primeira vez e está sendo muito enriquecedor! Conheci Ronaldo através do Responder Fazendo (@responderfazendo) e sempre acompanhei os trabalhos do CPA nas redes sociais. Inclusive, já divulguei muita coisa bacana deles na página. Ele é um diretor inquieto que, se for preciso, pede ao ator para repassar dez vezes a mesma cena até de fato ficar bom. É um diretor que tem um olhar muito inteligente para o palco e consegue transformar um simples diálogo em uma cena memorável. Está sendo um grande aprendizado fazer esta troca. Com todo o elenco, aliás.
Eunoteatro- Luiz, estamos muito felizes em tê-lo conosco e agradecemos por esta entrevista! Seja muito bem-vindo ao @eunoteatro, te desejamos muito sucesso. Até a próxima!
Siga Luiz Vieira no Instagram: @luizvieira.art | @responderfazendo
Entrevista por: Cíntia Duque @eunoteatro